31 de dezembro de 2012

Deslarga-me, 2012!

 
 
«Diccionario. Su hermana dice que es un catecismo, una guía mística; dice que su hermano es un turista que abre un mapa, en una estación desconocida, y busca como orientarse en un país extranjero. // También dice que esa lengua lejana es la suya y la escribe porque la está perdiendo y quiere fijar el sentido antes de caer en la melancolía. // Es un catálogo del saber microscópico de un náufrago, que se aferra a las palabras antes de hundirse definitivamente en la locura. // Imagina que este pequeño libro es un compendio a partir del cual será posible volver a empezar (alguien en el futuro puede combinar las palabras y obtener la historia completa de una vida o varias historias posibles de una misma vida repetida en distintos registros). // El primer diccionario conocido es de 1312. Samuel Johnson compara el diccionario con un reloj: un engranaje que clasifica las palabras, como el reloj clasifica el tiempo. (Practica el arte de clasificar la experiencia.)
 
Traducción. No hay traducción, no hace falta porque existe un solo lenguaje secreto (biológico), del que los demás son sólo variantes. Imposible por lo tanto imaginar un diccionario que establezca equivalencias entre palabras extranjeras, sólo existen palabras olvidadas de una lengua personal. // Sería entonces posible imaginar un diccionario de la lengua privada en el que brillara (como un sol muerto) el sentido. Un hecho único que revelara en toda su intensidad la clave de esa lengua personal.»
[Ricardo Piglia, Prisión perpetua; Anagrama, Outubro 2007]

... e ali ao lado

30 de dezembro de 2012

28 de dezembro de 2012

Full moon

O verdadeiro sabonete

[17m deluxe]

O vate Tolentino e o sacristão das Neves

«O Natal não é ornamento: é fermento...»

[levadado aqui e azedado aqui]

22 de dezembro de 2012

Venho de Sevilha a toque de Piglia

«Una vez mi padre me dio un consejo que nunca pude olvidar: “También los paranoicos tienen enemigos!”, me dijo, a los gritos, en el teléfono, tratanto de hacerse entender desde la lejanía, en febrero o marzo de 1957. No era un consejo pero siempre lo usé así: una máxima privada que condensa la experiencia de una vida.
Hay hombres sobrios y aplomados, a los que la desgracia los quiebra por adentro, sin que se vea. No saben quejarse, son ceremoniosos y gentiles, piensan que los demás actuarán con la mesma magnanimidad que ellos usan en la vida. El punto de máxima ruptura se produce cuando empieza el desengaño.
En esos días, en medio de la desbandada, en una de las habitaciones desmanteladas empecé a escribir un Diario. ¿Qué buscaba? Negar la realidad, rechazar lo que venía. La literatura es una forma privada de la utopía.»







«Los textos de este volumen no requieren mayor elucidación. Pueden ser leídos como páginas perdidas en el diario de un escritor y también como los primeros ensayos y tentativas de una autobiografía futura.
La crítica es la forma moderna de la autobiografía. Uno escribe su vida quando cree escribir sus lecturas. ¿No es a la inversa del Quijote? El crítico es aquele que encuentra su vida en el interior de los textos que lee.
En esa línea ha sido decisiva para mí la sorprendente anotación de Faulkner en su prólogo inédito a The Sound and the Fury. “Escribí este libro y aprendi a leer.” La escritura de ficción cambia el modo de leer y la crítica que escribe un escritor es el espejo secreto de su obra.
En este libro he trabajado sobre relatos reales y también sobre variantes e versiones imaginarias de argumentos existentes. Pequeños experimentos narrativos y relatos personales me han servido como modelos microscópicos de un mundo posible o como fragmentos del mapa de un remoto territorio desconocido. La literatura permite pensar lo que existe pero también lo que se anuncia y todavía no es.»

21 de dezembro de 2012

19 de dezembro de 2012

Cyber-dúvidas


Parafraseando Ruca:
o feminino de decano é (vai) decana ou será (bafo) decona?

[sou todo ouvido]

17 de dezembro de 2012

Não tá mal



16 de dezembro de 2012

Breve interlúdio musical




Porque a Net fornece um novo dia

Às vezes, lá calha...

«Quando Adolfo Marsanich saiu de casa, às 9 da manhã, imediatamente sentiu o peso de todo aquele dia; como de costume, entrou na sua rua de mau humor.»
(Elio Vittorini)

Nem sempre a lápis (340)

água tatuada
(1999)
 
A tatuagem sufoca a pele e nada me recorda o veneno dos teus odores. Sacudo o pó do coração, o enxofre dos lábios – pétala de gelo, acocorada no teu vulcão.
Assim como te evoco no saldo do desejo, somos cruéis até onde se morde a voz.
 
[fizeram-se aqui] 

Papiro do dia (282)

«Este homem, amarelo de poeira, de unhas negras, de cérebro lento e gasto, sonhava.
Sonhava como uma mulher que consumiu toda a sua juventude, toda a sua beleza na província e se lamenta de nunca ter pecado, nunca ter traído o marido, a casa, os filhos, de se ter deixado envelhecer na família, imaginando agora um futuro licencioso e desenfreado, cheio de excessivas orgias. Era preciso, antes de tudo, que o nomeassem comendador. Todos os funcionários do arquivo, de manhã à tarde, o cumprimentariam desse modo: “comendador”, em vez do pouco respeitoso “cavaleiro”. O governador perguntaria por ele aos porteiros com outro tom de voz: “Chama o comendador Mazzone, o comendador Mazzone, percebeste?” E, gritando do fundo dos corredores e do vão da escada, o seu nome seria ouvido por todas as repartições, até pelos da Polícia, e os pálidos ou os gordos colegas aguçariam o ouvido, roídos lá por dentro por um subtil caruncho de inveja.
Momentaneamente, satisfazia-o plenamente a concessão do título de comendador, a sua fantasia quase renunciava a ir mais longe e parava, saboreando longamente a voluptuosidade desta primeira ilusão.
Durante alguns dias gastava nela toda a meia hora de nirvana, mas, com o decorrer do tempo, a própria ilusão se libertava, o seu sonho aumentava e, no espaço de cinco, dez minutos, punha o cérebro num caos para despojar os superiores: o conselheiro de primeira, o inspector, o chefe do gabinete, o vice-governador, até que conseguia sentar-se à mesa de Sua Excelência, àquela enorme mesa de nogueira brilhante e entalhada, onde, de pé, tinha tremido mil vezes no esforço de se exprimir com precisão, de convencer com o olhar, de explicar com precisão, o coração apertado pela angustioso timidez que fomentava nele a presença daquele senhor situado oito degraus acima dele em ordenado e posição.»
[Elio Vittorini, Pequenos Burgueses; trad. Maria Manuela Gonçalves, Os Livros das Três Abelhas, Julho 1962;
buffet froid]

9 de dezembro de 2012

On/Off


7 de dezembro de 2012

Breve interlúdio musical


Porque a Net fornece um novo dia

Às vezes, lá calha...

«Um dia acordas e esfregas os olhos:
já não sabes porque acordaste.»
(Sándor Márai)

Nem sempre a lápis (339)

água tatuada
(1999)
Tem por única dor o rosto. Tudo o resto é progressão do medo, duplicidade da voz no deserto da pele. Nunca outra ave me doeu no peito, como o voo adiado ou interrompido sob o sangue.
Eu trabalho para que o teu sexo me amordace, num beijo mortífero e demorado.
[fizeram-se aqui]

Papiro do dia (281)

«A cozinha era escura e húmida; recordo-me de que o avô se lamentava continuamente e repetia a terrível palavra “húmida, húmida” com o mesmo ar de quando achava a sopa salgada. Ora a cozinha só tinha aquele nome por causa da grande chaminé, em volta da qual, nas noites de Inverno, se reuniam homens a beber e a jogar às cartas; de resto, servia de arrumação e armazém e encontrava-se apinhada de caixotes de rum vazios e de garrafas de água de Seltz, e nós, os garotos, estabelecemos aí o nosso quartel-general de acaso, como nos sugeria o nosso amor à guerra. Esquecerei alguma vez aquela grande casa com arcos, que cheirava a estrebaria e a selva e ressoava de cavalgadas, de abordagens, de pequenos gritos de macacos e de papagaios? Com uma pena de galo nos cabelos, o primo Boris e eu declarávamo-nos subitamente inimigos. Emilietta seria a nossa prisioneira. E foi; raptámo-la alternadamente, obrigando-a por vezes a ficar escondida num caixote, durante longas emboscadas imaginárias, aclamando-a rainha do Far-West, rainha do Mato Grosso, que eram os reinos onde Boris atirava o laço e eu esperava atingir com um tiro de Winchester o tigre de bico de águia e cauda de cascavel quando ele passasse.
Mas eu possuía ainda uma felicidade só minha, durante a noite, tremendo de frio no canapé de riscas vermelhas e amarelas, ou quando trepava ao monte de sacos de café para disparar sobre o acampamento de Boris. Excitava-me a proximidade do cinema, apesar de fechado, com os seus cartazes abandonados à entrada; o brilho da máquina de café palpitava dentro de mim como um nó de lágrimas, assim como o vapor angustiante do café brasileiro; depois foi a vez de ver a palavra “cólera”, que o avô agitou, ameaçadora, por cima da sopa, fazer voltar ao meu espírito o terror bíblico dos flagelos que eu conhecera através das histórias do ano anterior sobre o deserto banhado pelo meu pranto das babilónias destruídas.
Na cozinha, durante a noite, ouvia os estrondos do bombardeamento. “O que é um tiro de canhão?”, perguntava a mim mesmo. E parecia-me que devia sair deles um cavalo depois da explosão, um cavalo negro e sem cabeça, como o da minha outra infância de Siracusa, que saía das badaladas da meia-noite e galopava, galopava, na calçada da cidade com um espectro enorme na garupa. E de manhã, ao ir buscar uma tigela de leite, com as mãos nas algibeiras, eu via restos de ferro fumegando no ar silencioso, que me pareciam caçarolas ou frigideiras esquecidas ao lume, de passeio a passeio, depois da orgia de um povo em fuga.»
[Elio Vittorini, Pequenos Burgueses; trad. Maria Manuela Gonçalves, Os Livros das Três Abelhas, Julho 1962]

6 de dezembro de 2012


4 de dezembro de 2012

3 de dezembro de 2012

2 de dezembro de 2012

Breve interlúdio musical


 

Porque a Net fornece um novo dia


Às vezes, lá calha...

«Todas as novelas policiais são iguais. Uma por ano, está bem. Mas uma por semana revela falta de imaginação no leitor.»
(Ernesto Sabato)

Nem sempre a lápis (338)

água tatuada
(1999)

Morre-se a boca na tez crepuscular, retábulo de ardósia e liquescência. Mesmo que o pavor urbanize o desejo, com seus exércitos de fantasmas e hálitos podres, descubro-me de um belicismo que aterroriza a caça e coabita com as feras.
O Sol é um tigre ferido às portas do sono.

[fizeram-se aqui]

Papiro do dia (280)

«- A minha teoria, explicou, é a seguinte. A novela policial representa no século XX o mesmo que a novela de cavalaria no tempo de Cervantes. Creio mesmo que poderia fazer-se qualquer coisa de semelhante ao D. Quixote, uma sátira da novela policial. Imaginem uma pessoa que passou a vida a ler novelas policiais e atingiu a loucura de pensar que o mundo funciona como uma novela de Nicholas Blake ou de Ellery Queen. Imaginem que, finalmente, esse pobre tipo se lança a descobrir crimes e a proceder na vida real como um detective dessas novelas. Creio que se poderia fazer qualquer coisa de divertido, trágico, simbólico, satírico e belo.»
 
 
 
[Ernesto Sabato, O Túnel; trad. Francisco Vale, Relógio d’Água, s. d.]